O AMOR PODE SE TORNAR DOENÇA? Dependência Afetiva e Hipnose
Há muitas pessoas angustiadas com seu relacionamento amoroso. Sentem que fazem de tudo para seu(sua) companheiro(a) e o(a) mesmo(a) não corresponde aos seus desejos. Sentem que estão “amando demais” seu(sua) parceiro(a). Estão se dedicando à vida dele(a) tanto que acabam esquecendo a si mesmos. Percebem em si uma infelicidade inexplicável, pois são dedicadíssimos e estão ao lado de seu(sua) companheiro(a) haja o que houver, contudo ainda parece que falta alguma coisa para alcançar a felicidade conjugal. A auto-estima se torna rebaixada e esquecem de que também necessitam viver para si mesmos.
Estes são sintomas de Dependência Afetiva. O dependente é aquele que não tem recursos próprios e vive a expensas de outro. Afeto, aos olhos da psicologia, é o estado psicológico que permite ao ser humano demonstrar os seus sentimentos e emoções a si mesmo e/ou ao outro. Desta forma, pode-se pensar o termo Dependência Afetiva como a ausência de recursos emocionais próprios para demonstrar afeto, necessitando viver às custas da afetividade de outro, o que desencadeia muito sofrimento.
Esta postura de dependência, infelizmente pode esconder por trás de si emoções significativas como medos, traumas, tristezas, inseguranças e principalmente sentimentos de imobilidade, impotência, baixa-estima, despersonalização, dentre outros. Estes sentimentos tendem a impossibilitar a independência. A pessoa tem dificuldade de “andar com as próprias pernas” e tem a sensação de “estar amarrado com cordas poderosas e impossíveis de desatar”.
Em alguns casos, a angústia que esta situação gera é tão grande que o corpo da pessoa tenta resolver este impasse de outra forma, ou seja, ocorrem somatizações, que nada mais são do que a “transformação” desta angústia em dores ou problemas de saúde.
Para que esta situação se resolva é preciso tratar os traumas, descobrir qual é a mensagem que está por trás desta “dor”, e ressignificar os sentimentos, transformando-os em sentimentos de segurança, independência, auto-estima, mobilidade, esperança, coragem e alegria de viver.
Há muitas maneiras de fazer isto. Uma ferramenta poderosa que pode auxiliar neste processo é a hipnose associada com metáforas terapêuticas. Veja esta história retirada do livro de Dufour, Michel. Contos para Curar e Crescer. 1945. tradução de Alice Mesquita – São Paulo: Ground, 2005:
O cavalo de duas cabeças
Antigamente, havia um país inteiramente coberto por magníficos prados verdes onde viviam dois cavalos briosos de porte majestoso. Estes dois animais, um macho e uma fêmea, estavam sempre juntos. De manhã cedo, eles podiam ser vistos saltando e trotando pelos campos verdes. Gostavam de estar juntos e era imensa a amizade que os unia. Jamais se separavam; comiam, dormiam e brincavam sempre juntos.
Não havia nada no mundo que pudesse separá-los.
Uma noite quando estavam quase dormindo, recostados um no outro, fizeram um juramento: não importava o que acontecesse, eles nunca iriam se separar. Uma fada ouviu aquele juramento e perguntou-lhes:
- O que desejam?
- Queremos ficar juntos para sempre! Responderam sem hesitar.
E assim seu desejo se realizou. A fada os transformou num único cavalo, que não era nem macho nem fêmea, porém com duas magníficas cabeças. Dali em diante eles não precisariam mais se preocupar com o que o outro pensaria ou diria e nunca mais se separariam.
Um dia, no entanto, aconteceu uma desgraça. Uma das cabeças se sentiu mal, com estranhas perturbações que iam aumentando pouco a pouco. A outra cabeça como pegar a mesma enfermidade?
As duas cabeças começaram a conversar e depois de muito pensar, decidiram pedir à fada para transformá-los novamente no que eram antes.
Seu desejo foi novamente atendido.
Os dois animais retomaram rapidamente a saúde e a alegria. Mas tomaram consciência de que a autonomia era fundamental e que poderiam sempre descansar ou correr pelos vales, juntos ou separados, sem que isso afetasse a sua amizade.
Esta história trata fundamentalmente de situação de Dependência Afetiva. Histórias como esta, associadas ao trabalho psicoterápico podem mudar uma vida, pois são mais suscetíveis a serem aceitas, por chamar a atenção da pessoa ao trazer situação parecida com o que a pessoa vive e uma possível solução.
A hipnose, neste processo, acalma a mente racional, potencializando o trabalho terapêutico e facilitando para que o cérebro, mediante a intervenção terapêutica, passe a compreender a situação vivida de outra forma. Sendo assim, a pessoa passa a visualizar soluções e a ressignificar aqueles sentimentos negativos que a mantinham imóvel frente à vida.
Cumpre saber que, assim como se cuida de uma plantinha em crescimento, o trabalho com metáforas é apenas um passo para fortalecer a autonomia e independência afetiva. O caminho é simples, mas muitas vezes é necessário ajuda para que tudo se integre dentro da pessoa e para que ela passe a sentir, pensar e agir de forma coerente com sua sabedoria interior.
Keila Barossi